Fonte: TNSJ |
A sessão de 12 Março, a partir de peças curtas criadas por um conjunto de
autores e escritores portugueses, começou pela leitura de Luto, peça escrita por Jacinto Lucas Pires, um diálogo entre Lurdes
e António sobre uma história (porque, conforme é afirmado na primeira fala de
Lurdes, “todos temos uma história para contar…”) que começa com um cigarro
apagado, atravessa uma morte, um acidente rodoviário que vitimou a filha de
Lurdes, Marta, e termina no interior de um carro, estacionado debaixo do olhar
de um candeeiro que emana uma luz fraca, combalida.
Outra peça lida foi Parabéns, de Luís Campião, cuja acção se
passa numa câmara frigorífica, prelúdio de um enclausuramento, distribuída por
três personagens, Arnaldo, proprietário de um talho, homem de 61 anos, símbolo
da virilidade masculina, opressor, preconceituoso e autoritário, Henrique,
filho de Arnaldo, portador de uma personalidade mais indulgente, em oposição à
altivez do pai, e Zé, empregado no talho, paciente espectador das imprecações
corrosivas de Arnaldo. Interessante desfecho tem esta peça de Luís Campião, em
que a ditadura envergada pelo dono do talho, que é, ademais, claramente
racista, anti-semita e homofóbico, (há, aliás, uma alusão bem talhada aquela
afirmação que ornamenta as sombrias portas de Auschwitz, o trabalho liberta) é derrotada pelo amor partilhado entre Henrique
e Zé, união essa representada através de uma rosa vermelha, elemento disruptor
se considerarmos que o cenário descrito é preenchido por carnes congeladas,
ambiente lúgubre de um talho, que evoca inevitavelmente a carnificina exalada
em campos de concentração, indústrias de morte.
Fonte: TNSJ |
Outra peça, intitulada Tempo Suspenso/A Solidão do Palhaço, escrita por Paulinho Oliveira, é constituída
por um interessante monólogo, em tom de desabafo, que espelha a condição humana,
cénica, até existencial, do actor em
cima de um palco, perscrutado pelo olhar incessante do público, que vem
“espreitar” a “angústia” do mesmo. Mas tudo não passa, quiçá, de uma grande
falsidade, de uma representação sem termo, à excepção do próprio actor, despido
de papéis, pura carne, espectro do real. É o actor que abjurou a ficção. Mas,
não será isso mais um papel, um simples papel “falso”? Esta é a grande
capacidade de Paulinho Oliveira na peça, a capacidade de interrogar, de, por um
momento que seja, arrancar a máscara ao actor e atirar-lhe a realidade, a
frustração, as dúvidas, os sentimentos e as filosofias a um rosto desprotegido.
Por: Joaquim Pinto
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