Fonte: www.vimeo.com
"Cada desenho conta uma história". É desta forma que Luís Simões, de 32 anos, antigo motion designer da estação de televisão SIC, assinala a experiência de sair e desenhar pelas ruas do mundo. Um sonho tornado realidade, segundo o próprio, e que tem regresso marcado e Portugal daqui a cinco anos. Até lá, Luís regista esses momentos no site e no Facebook deste projeto.
Regina Machado: Em que país e cidade te
encontras neste preciso momento? Para contextualizar, descreve o ambiente à volta e o local.
Luís Simões: Neste momento estou na Bélgica, em Bruges.
Está um dia incrível de verão e existem turistas em toda a parte do centro da
cidade, o que acaba por definir muito da paisagem. Bruges é a cidade ideal para
se viver um apaixonado amor.
Pode-se passear pelos vários jardins, salpicados com os típicos gigantes moinhos nórdicos. Navegar pelos canais que abraçam todo o centro histórico. Apreciar uma quantidade de monumentos, fachadas e museus ou apanhar um valente escaldão enquanto se descansa num banco de madeira, entre fotos e conversas.
Pode-se passear pelos vários jardins, salpicados com os típicos gigantes moinhos nórdicos. Navegar pelos canais que abraçam todo o centro histórico. Apreciar uma quantidade de monumentos, fachadas e museus ou apanhar um valente escaldão enquanto se descansa num banco de madeira, entre fotos e conversas.
Vivo as cidades de
maneira diferente, por opção e necessidade em controlar os custos.
RM: Tiveste alguém que te apoiou sempre neste projeto, em
todas as fases?
LS: O maior apoio que tive foi interno. Foi um desafio para
mim durante anos acordar sempre com cada vez mais vontade de seguir em frente com este tipo de vida, tivesse eu que prescindir do que fosse possível para o
tornar real. Acabou por ser mais fácil do que imaginei. Contudo, senti um apoio
incondicional de uma amiga, quando lhe contei. Chama-se Susana Ruela e
trabalhávamos juntos na SIC. Sempre viveu com entusiasmo e otimismo todas as
fases.
RM: Aproximadamente quanto tempo demorou desde que te surgiu
primeiro esta ideia até que resolves cumprir este teu sonho?
LS: A ideia é muito jovem pois sempre sonhei em querer
desenhar nas ruas e viajar, mas concretamente demorou três anos. Dois anos na
minha cabeça e aproximadamente um ano para a montagem do projeto.
RM: Como foi organizar tudo? Organizar uma viagem de cinco anos
pelo mundo requer essencialmente o quê?
LS: É difícil organizar um projeto cuja essência é ser o mais
livre possível.
Qualquer plano que fizesse sabia que não passaria disso mesmo. Sabendo isso,
foi essencial saber realmente o que queria fazer e como, dentro de um prazo
estimado como 5 anos. Razão pela qual demorei
dois anos a amadurecer as ideias. O foco principal para ter as respostas
era saber o que me fazia e deixava completamente
feliz. Uma rota é fundamental; é
o esqueleto do projeto. Escolher o essencial para levar nas mochilas, tendo em
atenção que todo o material
de desenho era o mais importante. Ter dinheiro para o fazer. No meu caso
parti para esta aventura com 50 mil
euros para investir em mim, resultado da venda da minha casa e três anos a
juntar dinheiro. Não creio que exista um valor certo para o que vou fazer. Foi
o que consegui juntar e não me preocupei muito com isso, queria era ir! E por último o mais essencial de tudo ter vontade e atitude para ultrapassar as
dificuldades!
RM: Os teus pais vão acompanhar-te no teu sonho durante um
ano. Até que ponto é importante sentires os teus pais por perto durante este
primeiro ano? Acabam, eles próprios, por realizar um sonho deles acompanhando o
teu?
LS: Sim, é. Sobretudo porque estão a descobrir muitas das
coisas que lhes tentei explicar quando falava do que queria fazer nos próximos
anos. A minha presença na viagem deles é, para além de um preenchimento emocional, uma ajuda,
dada a experiência que tenho em viajar. Sem dúvida que também eles estão a concretizar um sonho,
dentro das suas idealizações e interesses. Tem sido gratificante este momento
com eles e é uma das partes mais
desafiantes neste ano da viagem. Desafiante, porque quando planeie a minha
vida em viagem, era para estar sozinho. Acabo por ser o
lado mais irrequieto e descontraído da viagem e eles são o lado mais racional e
planeado.
RM: Qual o país que sentes mais curiosidade em conhecer? E
qual o que estás ansioso por revisitar?
LS: Índia, Mongólia, Nova Zelândia, Bolívia, Japão. Estes
são alguns dos destinos que sempre tive vontade de os viver intensamente.
Ansioso por voltar às ilhas gregas, porque quando lá estive não desenhei nada,
assim como a Holanda. Fazia sete anos
que não ia a Barcelona e agora quando lá voltei, noutro registo, foi um
misto de emoções que não dá para explicar. Há
algo do passado, que nos recorda sensações e experiências que hoje se vivem
distintamente. Confesso que tenho muito mais
interesse nos países que nunca vivi.
RM: Como está a ser este sonho até agora? Os objetivos
para cada cidade e país estão a ser cumpridos?
LS: O sonho está a ser realizado aos poucos, porque existem
muitas fases, mas está a ser melhor do que esperava. Tenho recebido um "abraço" tremendo das pessoas que me abordam na rua e pedem para ver os meus cadernos. Tenho
conhecido e falado com gente de toda a parte do mundo. Não há dia que não tenha
uma história, uma ligação, um comentário aos meus desenhos, um momento de satisfação plena e contemplação,
que me faz estar constantemente feliz e
preenchido. Espanha foi o
exemplo perfeito de como gostaria de
conhecer um país. Foram dois meses em
que explorei, conheci, aprendi e apaixonei-me. Só assim se consegue
desfrutar da viagem com tempo para a desenhar.
RM: Nesta troca que tu próprio procuras entre outros urban sketchers (desenhadores urbanos), já notaste diferentes
técnicas, interesses (entre outras coisas) que tencionas adotar?
LS: Desenhar é uma
constante aprendizagem. Seria um erro se fechasse as portas ao forte
conhecimento com a experiência que estou a viver. Desde o primeiro desenho que
fiz até hoje tenho mudado constantemente. Quando olho para o primeiro caderno
vejo perfeitamente outro Luís a desenhar, mais sozinho e menos preenchido.
Hoje, porque me tornei numa esponja que
absorve técnicas e estilos com que
me identifico dos outros urban sketchers, vou testando em
cada desenho o que aprendi. Sei que vou desenhar tanto que o tempo irá
encarregar-se de me dizer qual será o meu caminho artístico. Limito-me apenas a
desenhar como e quando quero, o mais possível.
RM: Este contacto com estes teus colegas
pelo mundo tem-te enriquecido?
LS: Esse contacto foi sem dúvida uma das melhores ideias que
introduzi no projeto. Somos um grupo de
amigos, com uma paixão enorme pelo desenho. Não estamos em competição e não
temos medo de mostrar como e o que fazemos. Adoramos partilhar os materiais,
os desenhos, as técnicas e como procuramos um bom sitio para desenhar. Quando a
partilha é generosa saímos sempre a
ganhar dessas experiências. Já surgiram três momentos de crise artística desde que saí de Portugal e esses contactos mostraram-me outros caminhos a seguir.
Através deles e das centenas de horas que já passei na rua a
desenhar, aprendi muito. É um caminho longo e quanto mais
alto se sobe mais se vê.
RM: Tens receio estabeleceres elos tão fortes que a
efemeridade do tempo estabelecido para cada sítio acabasse por separa-los? O
que sentes em relação a isso?
LS: Aprendi a viver com os encontros e despedidas.
Não me tornei frio, mas aprende-se a dizer
"até já" com um sorriso
inquieto. Aprendi que se passares a barreira dos três dias com uma pessoa que gostas, será cada vez mais difícil a despedida. Aprendi que não devo deixar nada por dizer às
pessoas que conheço, nem que para isso tenha que explicar desde o início o que
ando a fazer e mostrar vezes sem conta os desenhos. Aprendi a viver os dias
como momentos únicos sem espaço para
nostalgia ou saudosismo. No fim o que interessa é o momento que passaste
com essa pessoa. Será sempre isso que guardas dentro de ti e que te faz querer regressar um dia a essa cidade.
RM: O viver tudo intensamente leva-te a acreditar que
aproveitaste tudo de cada cidade, de cada pessoa, de cada objeto e de cada contacto?
Não tens receio do que possivelmente se desenrolaria e que não pudeste ver?
LS: Foi algo que me
preocupou no início da viagem. Querer
ver tudo como se se tratasse da última oportunidade para o fazer. Hoje sei que é um erro querer ver tudo de
uma cidade ou de um pequeno povo. O ideal é apreciar bons
momentos sem nos preocuparmos com o resto. Neste momento não me importa se não
conheço tudo. Importo-me mais em conhecer e desfrutar onde estou. Já estive em cidades que não demorei mais que quatro horas. Nestes
casos escolho um lugar para desenhar
e com sorte conheço alguém pelo
caminho.
LS: Mais do que esperança, quero cruzar-me com essas pessoas. Tenho feito amigos que me mudaram e que tenciono estar com eles daqui por cinco anos. Guardo religiosamente os contactos na minha agenda e na altura do último abraço, escondendo a teimosa emoção, fica
sempre o desejo de nos querermos voltar
a ver. A internet é sem dúvida uma ajuda essencial para os manter em
contacto. Em Sevilha uma das pessoas
que mais me marcou fez-me a seguinte pergunta: "vamos voltar a ver-nos?". Fiquei sem uma resposta
segura, mas o nosso forte abraço disse que tudo farei para que sim.
LS: Felizmente tem vindo sempre a crescer o interesse pelo
projeto e pelos desenhos que vou fazendo dos sítios por onde passo. Sabe bem esse
carinho e tenho tentado retribuir com uma resposta a todos, o que nem sempre é
possível. Se me irão recordar no futuro, não sei. Acho que até lá vão
esquecendo. Existe muita curiosidade em saber se sou ou não capaz de cumprir os cinco anos. Entretanto sorrio e vivo sem pensar a longo prazo. Logo
se vê!
RM: Quando voltares a Portugal, o que vais querer fazer de
imediato?
LS: Ver a minha sobrinha, amigos e família, em particular a
minha avó. Mostrar-lhes os cadernos e contar-lhes o que vivi.
RM: No final da viagem, tencionas expor os teus sketches? Cada um tem certamente uma história
para contar.
LS: Há quem o queria mesmo em livros e filmes. Eu não
tenho planos para já, mas gostava de ter
a oportunidade de contar a todos
que me acompanham como correu cada momento da viagem apoiado com os vários
cadernos porque, sem dúvida, cada
desenho conta uma história; uma partilha
na primeira pessoa seria a melhor maneira de o fazer.
RM: Até agora tens cumprido o tempo/prazo estipulado
inicialmente? Feitas as contas, estarias em Portugal em que dia, mês e ano? O
que esperas encontrar cá e o que esperas que tenha desaparecido de vez?
LS: Nem por isso. Em Espanha demorei mais tempo do que esperava e isso fez-me alterar a rota, vou saltar Inglaterra para já e passar rápido por
França, Bélgica e Holanda. Gostaria de chegar no dia 20 de julho de 2017. Espero encontrar um espírito mais otimista e menos
corrupto ou cheio de
"facilitismos". E que haja mais criatividade em saber viver os bons momentos que a vida nos pode
oferecer.
Galeria de imagens
Imagens cedidas por Luís Simões
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